Integra do discurso do líder da UNITA na conferência sobre a paz e a estabilidade na África Austral
- 19 junho 2014
Luanda - DISCURSO DE ENCERRAMENTO DO PRESIDENTE DA UNITA, ISAÍAS SAMAKUVA, A MARGEM DO I CICLO DE CONFERÊNCIAS SOBRE A PAZ E A ESTABILIDADE NA ÁFRICA AUSTRAL: CONTRIBUTO DA UNITA PARA A HISTÓRIA
Fonte: UNITA
Minhas senhoras e meus senhores:
Agradeço,
antes de mais, a presença de todos que aceitaram o nosso convite para
estarem presentes nesta sessão de encerramento do primeiro ciclo de
conferências SOBRE A PAZ E A ESTABILIDADE NA ÁFRICA AUSTRAL – Um
contributo para a História.
Como
afirmamos na sessão de abertura deste ciclo de conferências,
pesquisadores, académicos e especialmente jovens estudantes,
licenciandos e mestrandos, têm procurado a UNITA para ouvir o seu ponto
de vista sobre aquilo que se pretende que seja a História da Paz em
Angola.
Em
resposta a esta procura, e ciente das suas responsabilidades
históricas, a UNITA decidiu realizar este I Ciclo de Conferências Sobre a
Paz, para apresentar uma parte do seu testemunho sobre a História que
ela própria viveu, as batalhas políticas, militares e diplomáticas que
ela própria travou, as alianças que ela própria forjou, os acordos que
ela própria assinou e a Paz que ela sempre buscou, tudo visando a
construção da nação angolana.
Sem
contar com o período de resitência à conquista e dominação do
território pela potência colonial, considero que a primeira parte da
História da construção da nossa Nação, a Nação angolana, foi vivida nos
anos de 1960 – 1975; a segunda parte foi vivida nos anos 1975 – 1991; a
terceira parte foi vivida nos anos 1991 – 2002 e a quarta parte
constitui o presente.
O
Ciclo de Conferências que hoje encerramos descreveu as principais
ocorrências e realidades vividas no periodo de 1960 a 2002, cobrindo
essencialmente, as quatro fases :
Realizamos
este I Ciclo de Conferências Sobre a História da Paz, para realçar o
facto de que a História da Paz em Angola não pode ser escrita nem vista
numa perspectiva de heroismo partidário nem tão pouco de propaganda
política. Se assim for, ela deixa de ser História.
A
Batalha do Kuito Kuanavale, por exemplo, tal como tem sido contada pelo
regime do MPLA, é um mito e é uma fraude à História que a verdade e a
memória colectiva dos protagonistas, mortos e vivos, exige que seja
ampla e corajosamente denunciada para ser profundamente reformulada.
Caros compatriotas:
Durante
cerca de oito semanas, a sociedade ouviu de alguns artífices da
História, na primeira pessoa, as respostas para muitas das suas
indagações sobre a natureza multidimensional da conflitualidade em
Angola; falaram sobre o impacto das batalhas militares na celebração dos
Acordos de Paz, sobre os caminhos tortuosos da diplomacia na busca da
paz; sobre o papel da mulher na construção da paz e também sobre a visão
da UNITA relativamente à integração regional de Angola.
Consideramos
que este primeiro ciclo de conferências sobre a História da Paz na
África Austral alcançou os seus objectivos principais sobretudo aqueles
que, como dissemos na sessão de abertura, se destinavam a “apresentar
factos com objectividade e lisura, tal como a UNITA os viveu” e
“constituir um fórum de reflexão sobre os melhores caminhos a trilhar
para se completar o processo inacabado de construção do edifício da
paz”.
É um facto estabelecido que a
História faz-se a partir da diversidade de muitos olhares. O facto
histórico é construído sob este paradigma, sob a interpretação de quem
vê, da forma como conta e sobre o que conta. Não se pode escrever a
história de Angola sem ouvir um dos principais protagonistas da história
de Angola, que é a UNITA .
Tal como
referiu o activista e escritor francês Georges Clemenceau que, como
Primeiro Ministro liderou a França na Primeira Guerra Mundial e assinou
mais tarde o Tratado de Versailles , "a História é coisa séria demais
para ser contada apenas por historiadores".
“Não
basta, para a História, ser descoberta e contada se não estiver próxima
dos protagonistas anónimos fazendo parte da formação do conhecimento e
do poder crítico”.
Os
factos aqui relatados durante as conferências realizadas, são
acontecimentos vividos e testemunhados pelos conferencistas que os
apresentaram, sendo eles Eugénio Ngolo Manuvakola, Lucamba Paulo Gato,
Abílio Kamalata Numa, Demóstenes Amós Chilingutila, todos generais na
Reserva e deputados à Assembleia Nacional, pela Dra. Miraldina Olga
Jamba, Deputada à Assembleia Nacional e Presidente da Liga da Mulher
Angolana; Dr. Alcides Sakala Simões, deputado à Assembleia Nacional e
professor universitário, Clarisse Kaputo, Deputada à Assembleia
Nacional; Doutor Almerindo Jaka Jamba, Historiador e Professor
Universitário; Engº. Adalberto da Costa Júnior, Deputado à Assembleia
Nacional, todos eles também veteranos e combatentes da Pátria. Constam
de documentos que vão constituir-se em documentos históricos e políticos
integrantes do acervo patrimonial da UNITA.
Deles
foram extraídas conclusões e teses que foram formalmente aprovadas pelo
seu Comité Permanente na sua reunião extraordinária realizada em
Luanda, nos dias 13 e 16 do corrente. Encerram, por isso, a posição
política da UNITA sobre os fenómenos então vividos e o seu contributo
tanto para a História da Paz em Angola, como para a construção dos
alicerces de uma Nação verdadeiramente independente, próspera e
Democrática.
Minhas senhoras e meus senhores:
Se
este Ciclo de Conferências foi um marco que lançou um novo olhar sobre o
passado, ele permite-nos também fazer uma análise distinta do presente e
um diferente prognóstico para o futuro.
E é sobre o presente e o futuro que também queremos falar.
Ao
longo dos últimos dois séculos, a afirmação da identidade social e
política de Angola tem sido objecto de conflitos, cumplicidades e
diálogos inconclusivos entre grupos nacionais, grupos económicos e
Estados.
Com
o avanço do período colonial, os portugueses desenvolveram estratégias
para apoderar-se das terras de Angola, exportar as suas riquezas e
excluir as maiorias do desenvolvimento. A conquista da independência, em
1975, e a conquista da paz militar em 1991 e depois em 2002, não
anularam estas políticas e, por isso, não produziram para Angola uma
identidade social e política que lhe assegurasse a paz social e a
segurança colectiva.
Hoje,
a estratificação, discriminação e exclusão das maiorias continua a ser
estabelecida por políticas públicas, o que significa dizer que Angola
saíu da escravatura para o colonialismo e do colonialismo para o
neocolonialismo.
O
Estado pós independência predeterminou a institucionalização da
supremacia de uma classe, de um partido e de áreas específicas do nosso
País. A política económica, a política de educação, a política de
terras, a política cultural e todas as outras políticas públicas foram
concebidas para materializar esta diferenciação e frustrar o nobre
objectivo de construção da Nação angolana.
Hoje,
uma oligarquia de algumas dezenas de famílias domina a política, as
Forças Armadas, a economia e a cultura; detém e controla mais de 90% da
riqueza através de um Estado predador, aliado ao exterior e por ele
protegido.
Os
três pilares sustentadores do progresso da Nação - o sistema de
educação, o sistema de saúde e o sistema judicial - estão moldados para
garantir o subdesenvolvimento das maiorias e a neo-colonização de
Angola.
Por
outro lado, as lideranças nacionalistas não herdaram nem instituições
nem tradições que pudessem servir de alicerce para a criação de laços
democráticos ou contrato social entre os cidadãos e o Estado. É certo
que a construção de uma nova ordem política teria apresentado enormes
desafios, ainda que a guerra geopolítica e o colapso económico não
houvessem tido lugar. Mas esse cenário positivo eliminara-se de raiz,
porquanto os Acordos de Paz, celebrados em 1991, ignoraram a necessidade
de se alicerçar a construção da nação na criação de instituições fortes
e legítimas. Apenas estabeleceram as balizas da mudança de regime e os
limites materiais de uma transição constitucional negociada, que, no
entanto, não foram observados.
Os
arquitectos da paz, assinaram em Bicesse um Acordo político para a
mudança de regime em Angola. Adoptaram para Angola o regime
democrático.
Este regime, porém, foi revogado na prática por um só homem.
No
espaço coberto por este I Ciclo de Conferências Sobre a Paz houve de
facto pelo menos três mudanças de regime político em Angola:
(1)
mudança do regime autoritário e colonialista português para o regime
totalitário de Partido único. Esta mudança ocorreu em 1975 e foi operada
Pelo Dr. Agostinho Neto, primeiro Presidente da República Popular de
Angola;
(2)
mudança do regime totalitário de Partido único para o regime de
democracia constitucional. Esta mudança ocorreu em 1991, por força das
batalhas militares e das consequentes negociações políticas entre o MPLA
e a UNITA em Bicesse; e foi fundamentalmente impulsionada pelo Dr.
Jonas Malheiro Savimbi;
(3)
mudança subversiva do regime democrático acordado em Bicesse para o
regime autoritário mascarado de democracia tutelada. Esta mudança está
em curso e é dirigida pelo Presidente José Eduardo dos Santos.
O
regime procura branquear ou mitigar a sua impopularidade interna por
via de actividades político-diplomáticas do Executivo na busca da paz
militar na África central, quando em casa se multiplicam os atentados à
paz e as violações mais grosseiras aos direitos humanos dos angolanos.
Mas não são os interesses externos de ocasião que garantem a
legitimidade política dos regimes. São os povos, pois a soberania reside
no povo. No povo angolano, na vontade exclusiva do povo angolano.
O
facto do regime ter decidido revogar os Acordos de Paz, e aliar-se ao
estrangeiro para abolir a democracia para os angolanos, violentar os
angolanos, pilhar os recursos dos angolanos e governar contra os
angolanos, agrava ainda mais a sua situação. Não importa o que digam os
seus aliados externos.
As
potências estrangeiras, quer os aliados quer os adversários na antiga
guerra fria, tendem a outorgar o benefício da dúvida ao governo
angolano, quer em matéria de direitos humanos, quer na questão da
transparência governativa ou mesmo da qualidade da democracia. De um
modo geral, a “comunidade internacional” tende a abaixar a cabeça e
calar-se colectivamente diante das violações públicas aos direitos
humanos dos angolanos e das agressões à boa governação, pelo Estado
angolano. Já faziam o mesmo com o governo fascista de Salazar. O que
eles querem são as riquezas de Angola, não a felicidade dos angolanos!
Até quando? Até quando? Até quando, compatriotas?
Este
desvio político, esta mudança arbitrária e unilateral de regime
político, constitui uma traição à Paz, um risco político sério para os
investimentos em Angola e um retrocesso no processo de construção da
nação.
Não
mais nos basta fazer o “mea culpa”. Precisamos sem tardar interpretar
estes comportamentos do regime e mudar a maneira de ver a nossa Angola,
sua história, seu presente e sobretudo o seu futuro.
Por
isso, prezados concidadãos, meus irmãos, mais do que rememorar o
passado, é altura de reavaliarmos o presente e posicionarmo-nos para o
futuro.
1.A
instauração efectiva da democracia em Angola e a concretização da
efectiva reconciliação nacional poderão encontrar no espírito de Bicesse
a base para a feitura do Novo Contrato Social Angolano e para a
efectiva integração regional de Angola.
2.A
reconciliação nacional efectiva exige a completa despartidarização do
Estado, a descentralização do poder político e económico, a dignificação
dos direitos humanos como valores indisponíveis aos poderes públicos e a
consequente adopção, por todos, de uma nova cultura política.
3.A
nova cultura política subjacente à busca da reconciliação nacional
envolve uma nova atitude e uma postura tolerante quer perante a verdade
dos factos que constituem a História da conflitualidade em Angola, em
todas as suas dimensões - incluindo a tragédia do 27 de Maio de 1977,
quer perante o desafio histórico da construção da Nação angolana.
Viva a UNITA, Viva Angola.
Com estas palavras, declaro encerrado o 1º Ciclo de Conferências sobre a Paz e a Estabilidade na África Austral.
Muito obrigado.