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miércoles, 24 de junio de 2015

Sobre a Visita do Presidente da Republica à China




Integra da Conferência de Imprensa sobre a visita do Presidente da República à China

CONFERÊNCIA DE IMPRENSA DO PRESIDENTE DA UNITA SOBRE A VISITA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA DE ANGOLA 
À REPÚBLICA POPULAR DA CHINA


Senhores jornalistas
Minhas senhoras e meus senhores,
Convidei a imprensa para transmitir ao povo angolano a nossa profunda preocupação com o silêncio de Sua Exa o Presidente da República sobre as razões reais da sua visita oficial à República Popular da China e os conteúdos dos Acordos que firmou.

O Presidente deixou o país no Domingo, dia 7 e regressou ao país na Segunda-feira, dia 15 de Junho. Hoje é dia 24 de Junho, o décimo dia desde o seu regresso e, apesar de tanta preocupação demonstrada por diversos sectores da sociedade angolana, o Senhor Presidente da República ainda não informou aos angolanos sobre o que realmente foi fazer à República Popular da China.

Os angolanos viram pela Televisão algumas imagens de Acordos a serem assinados em seu nome; ouviram falar sobre empréstimos que terão sido contraídos em seu nome cujos termos e condições não conhecem porque o seu representante não os informa.

Que tipo de acordos o Senhor Presidente da República celebrou ou mandou celebrar em nome de Angola lá na China?


Ninguém sabe.

Que tipo de compromissos o Senhor Presidente da República assumiu em nome dos angolanos todos?

Ninguém sabe.

Quanto dinheiro de facto pediu emprestado aos chineses? E em que condições? Ninguém sabe. Os chineses dizem que é confidencial e o nosso Presidente fica calado.

Não diz nada.

Não cabe aos analistas, nem aos chineses, nem aos empresários e muito menos aos comentadores políticos explicar aos angolanos o conteúdo dos Acordos com a China. Esta responsabilidade constitucional é exclusiva do Titular do Poder Executivo.

Não se trata de simples “cooperação” gratuita ou actos de amizade e de solidariedade. Trata-se de negócios. Grandes negócios e grandes compromissos que engajam o país e as gerações vindouras a longo prazo.

O silêncio do Senhor Presidente da República está a gerar muita preocupação e alguma especulação entre os cidadãos. As informações que vêm do palácio também não ajudam porque são contraditórias: primeiro diziam-nos que foi pedida uma moratória no pagamento da dívida actual. Depois disseram-nos que o Presidente não pediu qualquer moratória.

A UNITA está muito preocupada com esta situação. Não apenas pelo silêncio do Senhor Presidente da República ou pelas especulações que ele alimenta. Mas principalmente pelo facto de os actos que terão sido praticados pelo Senhor Presidente da República ou por sua ordem na República Popular da China não se enquadrarem no rol de competências de execução orçamental do Titular do Poder Executivo nem nas competências que a Constituição confere ao Presidente da República no domínio das relações internacionais.

Em síntese, com base no pouco que foi tornado público pelos serviços da Presidência da República, pelos Ministros da República ou pela imprensa, o Presidente José Eduardo dos Santos:

? Foi à China e terá definido com os chineses as condições gerais de empréstimos e de outras operações de crédito previstas no artigo 162º da Constituição. Ora, fazer esta definição não é matéria da competência governativa do Titular do Poder Executivo, que está delimitada no artigo 120º da Constituição. É matéria da competência exclusiva da Assembleia Nacional no domínio do controlo e da fiscalização.

? O Presidente da República foi à China e engajou o povo soberano de Angola em acordos cujos termos não foram previamente aprovados pelo único órgão de soberania com competência para o efeito, a Assembleia Nacional, como decorre das disposições conjugadas nos artigos 161º alínea e) e 121º alínea c), ambos da Constituição.

Esta última disposição estabelece que “compete ao Presidente da República assinar e ratificar os “acordos” e outros instrumentos internacionais, sim, mas “depois de aprovados” pelo órgão de soberania competente.

Mais estabelece a Constituição da República que se tais acordos incluírem empréstimos ou outras operações de crédito, então, o Titular do Poder Executivo não pode endividar o país para além dos limites constantes da Lei que aprova o Orçamento Geral do Estado.

Ora, de acordo com o Relatório de Fundamentação do Orçamento Geral do Estado Revisto, elaborado pelo Senhor Presidente da República, na sua página 27, parágrafo 71, o valor total do endividamento que a Assembleia Nacional autorizou, em nome do povo, para ser contraído no ano de 2015 limita-se a 1.105,5 mil milhões de Kwanzas, ou seja, cerca de 11 mil milhões de dólares ao câmbio de 2014 ou 9 mil milhões de dólares ao câmbio actual.

Este é o valor autorizado nos termos do número 4 do artigo 3º da Lei do OGE: 9 mil milhões de dólares. Até agora, o Presidente José Eduardo dos Santos já terá negociado ou contraído empréstimos na Europa e nos Estados Unidos no valor de cerca de um bilião e meio. Faltam então cerca de 7,5 mil milhões de dólares.

Ora, qual é exactamente o valor do empréstimo chinês que o Presidente da República contraíu para nós pagarmos? Quem autorizou? E sob que condições? Ninguém diz.

Não basta dizer que a China pode ajudar Angola na agricultura, na indústria, no comércio e na formação de quadros. Isto já sabemos, e não está em causa.

O que está em causa são os termos dos Acordos e os custos tangíveis e intangíveis dos mesmos. Por exemplo:
? Como são escolhidas as empresas chinesas ou angolanas que são pagas com o dinheiro das linhas de crédito que constituem a dívida pública com a China?
? Como se garante a competitividade dos preços que faturam?
? Qual é a percentagem obrigatória de mão-de-obra angolana que as empresas chinesas devem incorporar nas suas obras e contratos?
? Como se processa a transferência de tecnologia? Há provisões para garantir benefícios tangíveis para o empresariado nacional?
? Como se faz o controlo migratório dos cidadãos chineses, norte coreanos e outros que entram em Angola ao abrigo de tais contratos?
? Como se faz o controlo de qualidade e o controlo ambiental da produção chinesa em Angola?
? Como se garante o respeito da legislação laboral angolana e dos direitos dos trabalhadores pelas empresas chinesas?
? Como se fará o controlo dos equipamentos importados ao abrigo dos acordos governamentais que são utilizados sem custo por empresas privadas chinesas ou sino-angolanas?
? Há provisões para garantir com eficácia e independência a qualidade das obras dos chineses em Angola? Como se assegura a competitividade dos preços que serão praticados e a transparência no acesso, utilização e gestão das linhas de crédito?
? Qual será a taxa de juro aplicável ao referido empréstimo e em quanto tempo os angolanos terão de pagar o mesmo? A taxa é fixa ou variável?

Qualquer acordo, qualquer empréstimo que Angola venha a negociar para fazer face às necessidades de financiamento decorrentes dos investimentos públicos e da amortização da dívida pública previsto no OGE revisto de 2015, só pode ser materializado nos termos e nos limites da Constituição e da Lei que aprova o OGE revisto.

A aprovação implícita destes empréstimos, e suas condições, no quadro da aprovação do Orçamento Geral do Estado é uma competência política e legislativa da Assembleia Nacional, e não do Presidente da República.

Por causa disso, a Direcção da UNITA instruiu o seu Grupo parlamentar para convidar o Senhor Presidente da República a respeitar a Constituição, submetendo à aprovação ou ratificação da Assembleia Nacional os termos dos Acordos com a China, conforme estabelece a Constituição.

Vai ainda o Grupo Parlamentar da UNITA solicitar a criação de uma comissão parlamentar eventual de acompanhamento e controlo da implementação dos Acordos.


Senhores jornalistas:

A UNITA está profundamente preocupada com a conduta de Sua Exa. o Senhor Presidente da República neste domínio porque ela parece configurar violações graves à Constituição e à lei.

A UNITA entende que no quadro da Constituição, das normas e princípios democráticos de prestação de contas, de boa governação, da transparência e da ética política, o Executivo devia dar a conhecer ao país, através da Assembleia Nacional, os termos dos acordos agora estabelecidos.

Não tendo feito isso, a UNITA insta o Executivo a submeter agora à ratificação da Assembleia Nacional, nos termos da alínea k) do Artigo 161º e da alínea d) do Artigo 162º ambos da Constituição da República de Angola, os acordos estabelecidos, para que os angolanos tenham oportunidade de conhecer o seu real conteúdo, em virtude da imposição constitucional do artigo 52º da nossa lei fundamental, que estabelece o seguinte direito dos angolanos:

“Todo o cidadão tem o direito de participar na vida pública…..e de ser informado sobre os actos do Estado e a gestão dos assuntos públicos, nos termos da Constituição e da lei”.

Esta responsabilidade não é dos homens de negócios, do encarregado de negócios da China em Angola nem dos políticos e analistas que debatem pela Televisão os acordos que nem sempre conhecem. É uma responsabilidade constitucional e exclusiva do Senhor Presidente da República enquanto Titular do Poder Executivo.

Não pode haver Acordos confidenciais para os angolanos se esses acordos engajam Angola e os angolanos. Porque Angola não é propriedade de meia dúzia de pessoas.

Luanda, 24 de Junho de 2015
O Presidente da UNITA