.

.

domingo, 3 de junio de 2018

Mensagem do Presidente da UNITA sobre a implementação das Autarquias Locais em Angola

Mensagem do Presidente da UNITA sobre a implementação das Autarquias Locais em Angola
Epic 1.jpg
Caros compatriotas:

Gostaria de saudar e agradecer a todos quantos aceitaram estar aqui connosco, nesta manhã de sábado, apesar dos seus variados afazeres.
A minha saudação especial, porém, vai para as mulheres angolanas filiadas na LIMA (Liga da Mulher Angolana), que é o braço feminino da UNITA. Estamos em Junho e este mês é considerado na UNITA como o mês da LIMA, pois foi no seu decurso que, em 1972, no Kutaho, Província do Moxico, a LIMA foi fundada. Permitam-me, pois, felicitar as nossas mamãs, as nossas irmãs, as nossas filhas, as nossas companheiras, as nossas esposas, enfim as nossas mulheres da UNITA, por celebrarem mais um aniversário da existência da sua organização feminina. Vamos, certamente, no decorrer deste mês, presenciar inúmeras actividades comemorativas desta quadra. Desde já, aqui ficam os nossos votos no sentido de que elas se realizem num espírito de elevado sentido patriótico e de profunda reflexão sobre os desafios que a mulher angolana tem pela sua frente, na luta pela sua emancipação, pela igualdade de género e pelo seu empoderamento. Aqui fica expressa a nossa total solidariedade.
Caros compatriotas:
Comemoramos antes de ontem, o vigésimo sétimo aniversário da assinatura dos Acordos de Bicesse, documento histórico fundante da República de Angola. Foi em Bicesse que a UNITA e o MPLA traduziram num documento a paz democrática que os angolanos conquistaram com o seu sangue. O preço dessa paz foi a extinção das Forças Armadas de Libertação de Angola, as FALA, pela UNITA, a extinção das Forças Armadas Populares de Libertação de Angola, as FAPLA, pelo Governo, o fim do regime de Partido único e a consagração constitucional do regime democrático com as suas autarquias locais em todos os municípios, do respeito pelos direitos humanos, da soberania popular, da liberdade económica e da reconciliação nacional como fundamentos de uma nova ordem política e social para Angola.
Todas estas conquistas ficaram consagradas na Constituição da República de Angola de 2010, em cuja elaboração a UNITA participou activamente. Portanto, a UNITA conhece bem a razão de ser das diversas clausulas da Constituição da República de Angola, como por exemplo o âmbito da autonomia local, a função das autarquias locais e o sentido do principio instrumental do gradualismo. E, imitando o provérbio das gentes do Planalto Central que diz que quando na aldeia alguém mata um elefante, a conversa nessa aldeia é o elefante, achei pegar nesta questão das autarquias locais que é o tema dominante no País estes dias, para ser também o tema dominante desta actividade, quando comemoramos o 31 de Maio, data da assinatura dos históricos Acordos de Paz. Ao fazê-lo, estaremos a transmitir aos angolanos a posição da UNITA sobre o rumo que, nos termos da Constituição, o País deve seguir na implementação das autarquias locais .
De facto, por força da luta de resistência que empreendeu contra o totalitarismo e contra a hegemonia política de um partido estado em Angola, a UNITA conquistou para todos os angolanos o direito à liberdade política, económica e cultural. Com base nos Acordos de Paz Para Angola, subscritos em Bicesse, Portugal, em 31 de Maio de 1991, a UNITA exerceu o poder constituinte, junto com o MPLA, tendo participado na definição do quadro constitucional que impõe hoje aos poderes constituídos a obrigação de implementar as autarquias locais nos moldes definidos pela Carta Europeia de Autonomia Local de 1985, o que significa dizer com base nos princípios da autonomia local e da descentralização política e administrativa. É isso que consta da Acta nº.8/09 da Comissão Técnica da Comissão Constitucional da Assembleia Constituinte que deu lugar aos actuais artigos 213 e 214 da Constituição de Angola.
Nas últimas semanas, o MPLA tem utilizado auxiliares do Titular do poder executivo do Estado para veicular a sua visão partidária sobre as autarquias locais como sendo a visão do Estado.
O seu grande objectivo é confundir os angolanos e sustentar a tese do gradualismo, esvaziando subtilmente a necessidade da afirmação autónoma das autarquias locais em todo o país, como únicas pessoas colectivas territoriais a quem incumbe gerir e regulamentar, sob sua responsabilidade e no interesse das respectivas populações, os assuntos públicos locais em todo o país.
Prezados compatriotas e amigos,
Minhas senhoras e meus senhores:
Quero deixar bem claro que a UNITA não reconhece a nenhum auxiliar do titular do Poder executivo, legitimidade para veicular a posição do Estado angolano sobre a implementação das autarquias em Angola antes de ser debatida e aprovada pela Assembleia Nacional. O órgão do Estado a quem compete legislar com reserva absoluta sobre o sistema de organização e funcionamento do poder local, sobre os direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos e sua participação no exercício do poder local, é a Assembleia Nacional. A visão de uma força política não deve ser confundida com a visão de toda uma Nação.
Importa frisar que a expressão “gradualismo” parece algo pacífico, pouco controverso – significando apenas que as coisas se farão pouco-a-pouco e não tudo de uma vez – mas no contexto político e constitucional angolano, encerra uma questão política profunda que tem impacto na afirmação da independência nacional e da dignidade dos angolanos, na eficácia da organização do poder político e na repartição das finanças e do património públicos entre o Estado e os seus cidadãos. Trata-se de dividir o poder de decisão entre o Estado e os cidadãos e o dinheiro de todos por todos.
No quadro democrático, a Constituição estabeleceu quatro poderes separados e interdependentes: o Poder legislativo, o Poder Executivo, o Poder Judicial e o Poder Local. Os três primeiros são soberanos, o quarto não é soberano, mas é autónomo. Não deve depender de nenhum outro, mas tem de ser criado pelo poder legislativo. O MPLA não quer criar o Poder Local autónomo, cuja expressão principal são as autarquias locais. Afirma que não há condições para realizar eleições autárquicas nos mesmos municípios onde já se costumam realizar eleições gerais. Enquanto se criam as condições de forma gradual, o MPLA deseja continuar a governar todos os municípios, sem eleição, para continuar a desviar o dinheiro do povo que deveria ser canalizado para as autarquias resolverem os problemas locais.
O MPLA quer impedir a implementação das autarquias em todo o país porque sabe que vai ficar com menos dinheiro para a “acumulação primitiva de capital”. Sabe também que o poder local não é poder do Estado, é poder democrático, autónomo, dos cidadãos, com quem o Estado vai ter de dividir os dinheiros do Orçamento Geral do Estado para atender as necessidades da educação, da saúde, do emprego, da agricultura, da habitação, da juventude, enfim, dos assuntos públicos locais em cada município. Por isso, terá menos dinheiro para os actos de peculato, enriquecimento ilícito e corrupção, que ele mesmo institucionalizou. Quer manter o povo no sofrimento.
O gradualismo do MPLA deve ser rejeitado, porque empobrece os angolanos e atrasa tanto a consolidação democrática do Estado como o desenvolvimento económico do país.
Minhas senhoras e meus senhores:
A Constituição estabelece que “a organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais”.
Este enunciado linguístico, segundo a doutrina, aponta para quatro dimensões importantes da constitucionalização do poder local: a primeira afirma que as autarquias constituem um pilar da própria organização democrático-constitucional do Estado, e não um simples dado orgânico-sociológico, preexistente à própria conformação constitucional da organização do poder político; a segunda dimensão afirma que a administração local é configurada como uma administração política, democraticamente legitimada, e só nesta veste ela pode confirmar-se como dimensão da organização democrática do Estado; a terceira significa que as autarquias locais são a expressão imediata da organização democrática do poder político republicano, e não meras corporações administrativas de “administração indirecta” do Estado; a quarta dimensão acautela que ninguém deve ter medo do poder autónomo das autarquias locais porque a legitimação constitucional da autonomia local não converte as autarquias locais em “pequenas repúblicas autónomas”, pois, elas não podem deixar de estar compreendidas na “organização democrática do Estado”.
A organização territorial autárquica é tanto uma garantia institucional da autonomia local como uma imposição constitucional. Assim como o poder executivo, o poder legislativo e o poder judicial são exercidos em nome do povo em todo o território nacional, assim também o poder local deve ser exercido directamente pelo povo em todo o território nacional, nas condições que o país oferece. Não pode haver poder local num município e noutros não. Não pode haver eleições autárquicas no Norte e no Sul não, no Oeste e no leste não, porque não há cidadãos de primeira e cidadãos de segunda. Todos são iguais perante a lei e têm todos os mesmos direitos e deveres.
Por outro lado, a garantia constitucional das autarquias locais tem um sentido institucional – garantia institucional – e não um sentido individual. Assegura-se a existência da forma de organização territorial autárquica em todo o país, e não de uma ou outra autarquia individual onde nos apeteça.
Nenhuma maioria legislativa, por mais qualificada que seja, deve impedir, evitar ou adiar a organização autárquica em qualquer parcela do território nacional. A nossa República é um Estado unitário que respeita na sua organização os princípios da autonomia dos órgãos do poder local. Se o Estado exerce a sua soberania sobre a totalidade do território angolano, então lá onde há Estado deve haver também autarquias locais. Todo o país deve ser um conjunto de autarquias da mesma forma que todo o país é um conjunto de províncias e municípios.
A UNITA exorta os angolanos a rejeitar firmemente a visão gradualista do MPLA na introdução das autarquias, com base em quatro razões fundamentais:
1- Entra em conflito com o objectivo da descentralização democrática previsto na Constituição.
2- Traduz uma política que atenta contra a unidade do Estado democrático e contra a igualdade dos seus cidadãos no que respeita à universalidade dos direitos, das liberdades e das garantias constitucionalmente protegidos.
3- Aumenta as assimetrias e as desigualdades sociais e territoriais ao longo da divisão rural-urbano.
4- Potencia a continuação dos roubos, da corrupção e da impunidade.

Vamos sustentar cada uma dessas razões.

1. A visão gradualista do MPLA entra em conflito com o objectivo da descentralização democrática previsto na Constituição.
Agora que o país exige a consagração imediata das autarquias locais, o Executivo vem dizer que não há condições, que precisa primeiro de reforçar a desconcentração, fazer estudos e experiências piloto, para só depois proceder à descentralização por via da autarquização. Pretende transferir recursos e competências PRIMEIRO para as Administrações Municipais E SÓ DEPOIS, daqui a 5 ou 10 anos, para as autarquias. Não podemos aceitar este argumento, porque é falso. Já foram feitos inúmeros estudos, já foram produzidas dezenas de normas, tudo está pronto. Não é preciso gradualismo. As autarquias só não foram implementadas até hoje por falta de vontade política. Vamos recordar:
? Em 1995 foi publicado o Decreto 6/95 sobre a Desconcentração Financeira, conferindo poderes ao Ministro das Finanças para estabelecer impostos sobre o património local e atribuir uma percentagem dessas receitas aos orçamentos locais de todas as províncias. Aqui, O Estado tratou todo o território por igual, não houve gradualismo. O mesmo Decreto atribuiu aos Governos Provinciais, todos eles, poderes para estabelecer critérios e mecanismos de subdivisão dos seus orçamentos. Não houve gradualismo.
? Um ano depois, em 1996, foram publicados os Despachos n.º 29/96 e n.º 38/96 que consignam 10% das receitas petrolíferas respectivamente às províncias do Zaire e Cabinda. Todos os municípios dessas provinciais produtoras de petróleo beneficiaram ou pelo menos assim ficou estabelecido, dessas receitas ao mesmo tempo. Não houve gradualismo.
? Em 1999, através do Decreto nº. 80/99, do Ministério das Finanças, atribuiu aos Governos Provinciais a título transitório, até à aprovação da lei sobre finanças locais, um conjunto de impostos e outras receitas arrecadadas ao nível das respectivas províncias, todas as províncias, o que terá beneficiado também todos os municípios aos mesmo tempo. Não houve gradualismo.
? No mesmo ano, surge uma ferramenta muito importante, que é o Decreto n.º 17/99 sobre a orgânica dos Governos Provinciais e das Administrações Municipais e Comunais, dando início ao processo de desconcentração, mudando a gestão das delegações sectoriais para os governos locais, a quem passam a responder hierarquicamente por meio de direcções provinciais, e metodologicamente ao Ministério de tutela. Aplicou-se a todos os municípios ao mesmo tempo. Não houve gradualismo.
? Um ano depois surgem o Decreto 27/00 sobre o Regulamento dos Governos Provinciais, Administrações Municipais e Comunais, na sequência ao Decreto 17/99 e o Decreto 30/00 que consigna 10% das receitas diamantíferas, às províncias da Lunda Norte, Lunda Sul e Moxico. Todos os municípios do Leste do país foram abrangidos. Não se alegou falta de condições nem falta de quadros, nem falta de infra-estruturas. Não houve gradualismo.
? Ao longo dos anos, houve uma série de iniciativas para se efectivar a descentralização, tais como: Estudo da Macro Estrutura da Administração Central (1999); Plano Estratégico Para a Descentralização e Desconcentração (2001), Estudo Sobre a Macro Estrutura da Administração Local (2002, MAT e PNUD); Encontro Nacional sobre Administração Local (2004); Fórum Parlamentar sobre Organização e Desenvolvimento do Poder Local e Autoridade Tradicional (2004); Programa do Governo (2005/6); Todos estes estudos produziram várias constatações e recomendações. Tudo já foi estudado. E quando fizemos a Constituição de 2010, revimos todos estes estudos e concluímos que poderíamos implementar as autarquias em 2012. Propusemos isso ao MPLA. O MPLA rejeitou. Agora, passaram-se oito anos, estamos em 2018. Já não precisamos de esperar mais. Precisamos de passar à acção: Autarquias JÁ. EM TODOS OS MUNICÍPIOS. PORQUE OS ESTUDOS FORAM FEITOS PARA TODOS OS MUNICÍPIOS.
Então, começaram a preparar as condições para a descentralização em 1995. Até hoje, 23 anos depois, ainda não acabaram? Onde estão os resultados dos estudos dos 41 municípios pilotos que foram escolhidos para se experimentar a descentralização?

Só podemos chegar a uma conclusão: ou este governo não tem vontade política para implementar as autarquias locais ou tem outra razão e não aquelas que tem estado a mencionar, pois não há razões objectivas para não se implementarem as autarquias em todos os municípios ao mesmo tempo.
2 - A organização territorial autárquica implica a descentralização financeira
Alguns tecnocratas e políticos do Partido-estado argumentam também que as autarquias não podem ser implementadas em todos os municípios agora porque “a maioria deles não tem condições de arrecadar receitas próprias para poder ter autonomia financeira. E não pode haver autarquia sem autonomia financeira”.
Esta é outra mentira para enganar os angolanos. A autonomia financeira não é isso. Vamos explicar:
Quando a Constituição manda efectuar a descentralização administrativa manda também efectuar a descentralização financeira, porque a descentralização administrava de competências deve ser acompanhada da “descentralização financeira”. Assim, afirma-se que as autarquias locais têm património e finanças próprias, e que “o regime das finanças locais” será estabelecido por lei e visará “a justa repartição dos recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias, “a necessária correcção de desigualdades entre autarquias” e a “ consagração da arrecadação de receitas e dos limites de realização de despesas” (artigo 217.º, nº 3).
Descentralização financeira significa transferência directa do dinheiro do OGE do Ministério das Finanças para as Autarquias locais. Quando o Estado transfere o dinheiro, a autarquia “arrecada a receita” e pode “dispor” dela. Quanto dinheiro vai ser transferido? Depende da densidade populacional de cada município, das carências das pessoas que lá vivem, das atribuições da autarquia e das próprias receitas que o Estado recebe. O Estado vai transferir dinheiro para as autarquias assim como transfere para o Ministério da Saúde ou para as Forças Armadas. A maior parte das receitas das autarquias há-de provir do Estado, para cobrir as despesas públicas do território.
Os seja, ao invés do Ministério da Saúde receber a verba para cobrir as despesas dos postos médicos e hospitais públicos de Viana, por exemplo, o Estado envia esta verba para a autarquia de Viana, que é a entidade responsável por gerir a saúde pública a nível do Município. É isto que significa fazer a “justa repartição dos recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias”.
Além disso, voltando ao exemplo de Viana, a autarquia de Viana tem aqui a Zona Económica Especial. Tem indústrias, tem muitos terrenos, prédios e muito comércio. O Estado pode atribuir-lhe alguns dos impostos que cobrar. Estas serão receitas próprias da autarquia.
Mas nem todas as autarquias serão iguais. Há de facto lugares onde não há actividade económica nem património público. Quer isto dizer que não haverá lá autarquias? De forma alguma. Onde é que elas irão buscar o dinheiro para cuidar das necessidades das populações? A Constituição responde:
“O Estado estabelece o regime das finanças locais…tendo em vista…a necessária correcção de desigualdades entre autarquias…”
Quer dizer, a lei vai estabelecer mecanismos para que uma autarquia mais abastada financie uma autarquia mais carente, para além da quota a que todas terão direito de receber do Estado.
O argumento do MPLA sobre a autonomia financeira das autarquias é falso, porque a própria Constituição já admite que haverá desigualdades entre as autarquias. Naturalmente. No entanto, esta desigualdade natural não é desculpa para não se estabelecerem as autarquias. A lei deve visar corrigir as desigualdades financeiras entre as autarquias. E para corrigi-las, as autarquias têm de existir primeiro.
Não há necessidade de gradualismo geográfico por causa da ausência de actividade económica no município.
Então, o que significa a autonomia financeira?
Segundo a doutrina, a autonomia financeira, assenta, designadamente, nos seguintes poderes dos órgãos das autarquias locais:
1- elaborar, aprovar e modificar as opções do plano, orçamentos e outros documentos previsionais:
2- elaborar e aprovar os documentos de prestação de contas:
3- arrecadar e dispor de receitas que por lei lhes forem destinadas e ordenar e processar as despesas legalmente autorizadas;
4- gerir o seu próprio património, bem como aquele que lhe for afecto.
É este o significado de autonomia financeira. E nada mais. Autonomia financeira não significa que a unidade orçamental tem de produzir ela própria, dinheiro. O Ministério do Trabalho, por exemplo, tem autonomia financeira, mas não produz dinheiro. A Comissão Nacional Eleitoral tem autonomia financeira, mas não produz dinheiro. As Forças Armadas têm autonomia financeira, mas não produzem dinheiro.
Os argumentos financeiros que sustentam a visão gradualista do MPLA sobre as autarquias locais devem ser rejeitados porque são falsos e visam enganar os angolanos.
2. A visão gradualista do MPLA produz uma política neocolonial, que atenta contra a independência nacional, contra a unidade do Estado democrático e contra a igualdade dos seus cidadãos no que respeita à universalidade dos direitos, das liberdades e das garantias constitucionalmente protegidos.
Prezados compatriotas:
As autarquias não são um bicho de sete cabeças. Não vão dividir o país, como temem alguns. Todo o Estado moderno tem autarquias para administrar os assuntos públicos locais. Angola já tinha autarquias antes da independência. Foram as autarquias locais que impulsionaram a diversificação da economia, a exportação de produtos agrícolas e o desenvolvimento económico do território antes de 1975.
Até 1975, por força do Decreto número 45374, de 22 de Novembro de 1963, que estabeleceu o Estatuto político administrativo da província de Angola, o território no nosso país estava dividido em 16 Distritos, 120 Concelhos, 37 Circunscrições Administrativas, 423 Postos Administrativos, 72 Câmaras Municipais, 47 Comissões Municipais e 34 Juntas de Freguesias.
As autarquias de primeiro nível eram os 120 concelhos (equivalentes aos municípios de hoje). A maioria deles não tinha infra-estruturas em toda a sua extensão e tinha fraca densidade populacional. Todavia, tinham todas órgãos eleitos, excepto as câmaras municipais que eram presididas por um presidente, nomeado pelo governador-geral.
Os Concelhos e as Câmaras Municipais eram responsáveis pela distribuição e comercialização de água e luz, construção de infra-estruturas de apoio, tais como hospitais, escolas, estradas, mercados e jardins e habitação social.
Os postos administrativos correspondem às comunas de hoje e equivalem às autarquias inframunicipais, previstas na Constituição.
Angola tinha autarquias com menos de 5,000 habitantes, porque o que constitui autarquia não são as infra-estruturas, é o território e as pessoas que lá moram, sejam 150, 3,000, 18,000 ou 200,000 pessoas. Autarquia significa autogoverno. As pessoas da mesma vizinhança cuidarem dos assuntos da vizinhança, da vida em comum: o saneamento, os mercados, os postos de saúde, os jardins, os parques, a urbanização, etc. Não se constrói as infra-estruturas para se ter autarquias. É o contrário: estabelecem-se as autarquias para se construírem mais infra-estruturas para o desenvolvimento do país. E foi assim que Angola se desenvolveu de tal forma que, quando os guerrilheiros dos movimentos de libertação que conquistaram a independência saíram das matas e regressaram às cidades em 1975, já as cidades que haviam deixado tinham conhecido alguma evolução. Tudo estava mudado. Este é o lado positivo das autarquias da colónia de Angola. Há porém um lado negativo.
O regime colonial estratificou a sociedade em três classes: os europeus, os assimilados e os indígenas. Por força disso, existiam por um lado normas que regulavam os direitos, deveres e garantias dos cidadãos portugueses e dos assimilados (que eram considerados “civilizados”) e, por outro lado, normas que regulavam a situação jurídica dos indígenas. Os primeiros tinham direito à autonomia local e podiam participar nas eleições autárquicas. Os indígenas não.
Era através dos postos administrativos que o regime colonial cimentava a divisão de Angola entre rural e urbano e concretizava as desigualdades sociais, em particular a exclusão social dos indígenas. Em termos quantitativos, os indígenas representaram sempre a esmagadora maioria e viviam fora das áreas urbanas. Em 1973, o número de indígenas ultrapassava os 5 milhões enquanto o número de “civilizados” não chegava aos 400 000, dos quais os de origem europeia eram em número ligeiramente superior aos de origem africana. Portanto, nas eleições autárquicas, apenas os “civilizados” podiam votar. A grande maioria, os milhões de indígenas, tinham de esperar cinco, dez ou quinze anos, para se tornarem civilizados e poder votar. Era o gradualismo.
Hoje, o MPLA, pretende fazer a mesma coisa: impedir a maioria dos angolanos, por sinal na maior parte filhos dos indígenas, de exercer o direito de voto nas eleições autárquicas. É uma atitude discriminatória que os angolanos todos devem repudiar e rejeitar. Somos ou não todos cidadãos?
Como Angola herdou de Portugal as autarquias locais, a Primeira Constituição proclamada pelo Comité Central do MPLA em Novembro de 1975 ainda tinha a palavra “autarquias”, no seu artigo 51.º, que estabelecia o seguinte, cito: “As autarquias locais têm personalidade jurídica e gozam de autonomia administrativa e financeira”.
Percebe-se assim, sem grande margem para dúvidas, que o legislador constituinte de 1975, previa já a instalação do poder autárquico em Angola. O que importa agora indagar é a questão de saber de 1975 a 2018, porque é que o MPLA recuou e retirou depois o termo “autarquias” da Constituição revista em 1978, da Constituição revista em 1991 e da Lei Constitucional de 1992. O termo só voltou a aparecer na Constituição de 2010, em parte por força das propostas da UNITA.
Agora, o MPLA já não pode recuar mais. Tem de aceitar as autarquias na sua plenitude mesmo que considere que elas lhe foram impostas. Se foram impostas, foram impostas pelos angolanos, os donos do País. O nosso dever sagrado agora é impor mesmo a implementação das autarquias locais em todo o país. Impedir os filhos dos indígenas de exercer o poder local é um atentado à cidadania.
Angola não pode permitir que o MPLA transforme a maioria dos seus filhos genuínos em súbditos feudais ou súbditos neocoloniais até 2035, enquanto uma minoria é considerada cidadãos.
3. A visão gradualista do MPLA aumenta as assimetrias e as desigualdades sociais e territoriais ao longo da divisão rural-urbano.
Durante os 43 anos de governação, o Partido-estado aprofundou as desigualdades ou assimetrias territoriais e sociais. Hoje, ele tem a obrigação de desconstruir esta realidade. Mas ao invés de desconstruir as assimetrias, o MPLA quer aprofundá-las com o seu gradualismo, quer atrasar o desenvolvimento harmonioso e sustentado de todo o território nacional. Ao invés de elevar a qualidade de vida dos grupos populacionais mais desfavorecidos, quer dizer, daqueles que vivem lá onde não há infra-estruturas, o MPLA quer aumentar ainda mais a sua pobreza.
Esta divisão reflectida na oposição entre a população urbana de cultura europeizada e a população rural de cultura bantu, constitui hoje uma das maiores dificuldades à formação de uma verdadeira nação angolana.
4. A visão gradualista do MPLA potencia a continuação dos roubos, da corrupção e da impunidade.
Se Angola permitir que o MPLA continue a governar sem eleição a maior parte do território por via das Administrações Municipais, os roubos vão continuar, a corrupção vai aumentar, porque o MPLA é o Partido que institucionalizou a corrupção em Angola e é incapaz de combate-la com êxito.
Ao contrário, se Angola combater com êxito o gradualismo neocolonial, todos os angolanos irão participar na gestão dos assuntos públicos locais. Como resultado directo das eleições autárquicas, os Ministros do poder central já não vão negociar e assinar todos os contratos para os serviços públicos. Aumentará a oferta de serviços, os investidores serão atraídos para o interior, aumentará a oferta de empregos e a competitividade vai ajudar a baixar os custos. Haverá mais pessoas responsáveis e competentes a defender a ética e combater a corrupção. Os governantes e os governados residirão juntos. Os actos dos governantes serão fiscalizados pelos seus vizinhos. Os projectos de desenvolvimento e os orçamentos serão discutidos por todos, a agricultura vai florescer, as exportações vão aumentar e o pais vai crescer.

Minhas senhoras e meus senhores:
Esta é a posição da UNITA sobre as autarquias e a forma como devem ser implementadas. Visto no seu conjunto, uma série de artigos constitucionais apontam para o universalismo e não para o gradualismo. O artigo 22.º evoca o “princípio da universalidade”, significando que todos os cidadãos têm os mesmos direitos e deveres. O artigo 23.º garante a “igualdade” – que todos são iguais perante a lei, e que ninguém pode ser prejudicado ou privilegiado (mesmo em razão do seu local de nascimento ou condição económica). O artigo 52.º cria uma norma particularmente forte: ‘Todo o cidadão tem o direito de participar na vida política e na direcção dos assuntos públicos, directamente ou por intermédio de representantes livremente eleitos’. Finalmente, o artigo 54.º garante que “Todo o cidadão, maior de dezoito anos, tem o direito de votar e ser eleito para qualquer órgão electivo do Estado e do poder local e de desempenhar os seus cargos ou mandatos, nos termos da Constituição e da lei.”
Todos estes princípios constitucionais apontam em sentido contrário ao princípio de gradualismo geográfico na introdução das autarquias. Isto é, sugerem que os “direitos autárquicos” devem ser introduzidos ao mesmo tempo para todos os cidadãos.
EM RESUMO:
É nossa convicção que o modelo gradualista de Moçambique atrasa o desenvolvimento e promove a “politização” completa da administração autárquica. Por isso, não serve para Angola.

Defendemos que todas a autarquias obrigatórias, as autarquias municipais, devem ser criadas ao mesmo tempo, junto com as autarquias supra municipais, que poderão assumir a forma de Regiões administrativas. Luanda e Cabinda são sérios candidatos para este novo Estatuto de autonomia local, nos marcos da Constituição. Os primeiros órgãos destes dois tipos de autarquia deverão ser eleitos em 2020. O desempenho das autarquias municipais e das suas relações institucionais é que ditarão a oportunidade para a criação das autarquias inframunicipais..

As autarquias constituem-se como entidade governante dos municípios e a administração municipal do Estado desaparece, nos termos da Constituição. O representante do Estado na Província poderá ser o governador provincial, que será investido de novas competências, sem qualquer interferência na administração autárquica.
Defendemos o universalismo geográfico e o gradualismo funcional: As autarquias introduzem-se simultaneamente em todo o país, o que significa fazer eleições locais em que todos os angolanos possam votar, tanto os filhos dos indígenas como os filhos dos portugueses e de outros ascendentes dos angolanos. Ninguém deve ser excluído do exercício do direito fundamental de sufrágio, consagrado pelo artigo 54.º da Constituição.
O gradualismo funcional significa que, a transferência de competências do poder central para o poder local será feita de forma gradual, consoante as capacidades . Certas competências, como por exemplo o embelezamento de espaços públicos, recolha de resíduos sólidos, bibliotecas, construção de escolas primárias (não as despesas correntes), podem certamente ser transferidas imediatamente para todos os Executivos Autárquicos. Outras competências tipicamente de responsabilidade local – como a canalização de água, pavimentação de vias principais, iluminação pública, policiamento local – são possivelmente fora do alcance de muitas autarquias rurais, mas dentro da capacidade de gestão dos governos locais das cidades maiores.
É nossa convicção que as autarquias locais em Angola são autoridades autónomas que promovem o desenvolvimento económico e social das famílias e atraem o investimento para garantir o crescimento económico a nível local e regional. Elas constituem uma nova administração, a administração autónoma dos cidadãos. Será mais robusta, mais eficaz, mais próxima do cidadão e mais numerosa do que a Administração Pública.
Com base nas atribuições que a Constituição lhe reserva, a administração autárquica deverá empregar mais de 200.000 funcionários e poderá gerir e administrar uma parte significativa das receitas próprias do Orçamento Geral do Estado.
Um número muito significativo de serviços públicos será prestado às comunidades pelas autarquias. Isto significa que consideráveis investimentos públicos em equipamentos colectivos, sistemas de abastecimento público e redes de logística, transportes, água, luz e comunicações reforçarão a importância socioeconómica da administração autárquica.
Defendemos que a nova administração autárquica tenha sob sua jurisdição dezenas de serviços municipalizados de interesse local que tenham por objecto explorar, sob forma industrial, algumas das actividades seguintes: captação, condução, e distribuição de água potável; produção, transporte e distribuição de gás de iluminação; aproveitamento, depuração e transformação de esgotos, lixos e detritos; construção e funcionamento de mercados, frigoríficos, balneários, estabelecimentos de águas mineromedicinais, lavadouros públicos, matança de reses, transporte, distribuição e venda de carnes verdes e transportes colectivos de pessoas e mercadorias.
Estes serviços são criados pela Assembleia Municipal e poderão ser geridos por um Conselho de Administração. São verdadeiras empresas públicas municipais que, não tendo personalidade jurídica, estão integrados na pessoa colectiva autarquica. Podem também ser transformados em empresas públicas.
A UNITA considera ainda que as autarquias devem ter um quadro de pessoal técnico e administrativo permanente à sua disposição, que, em alguns casos, por economia ou escassez de recursos, pode estar vinculado a outras autarquias ou ao poder central. É importante manter uma capacidade técnica que sustente a autarquia e os seus serviços, enquanto a direcção geral é dos políticos.

Por outro lado, defendemos que tudo deve ser feito para se evitar a politização ou partidarização das autarquias. Elas são instituições territoriais públicas, prestadoras de serviços para todos os residentes, e não “pertencem”, de nenhuma forma, ao partido que estiver a governar. Pelo contrário, a autarquia é permanente, enquanto o seu Presidente e a sua Assembleia exercem mandatos temporários por escolha dos cidadãos.

A UNITA reitera a sua total disponibilidade para continuar a ouvir e acatar as opiniões diferentes da sociedade com vista a se construir o mais amplo consenso nacional para o estabelecimento das autarquias locais em Angola.
Tal como defendemos aquando da feitura da Constituição, não vamos partidarizar as autarquias. Queremos capacitar os angolanos para servir os angolanos na promoção do seu bem estar. Aqueles que desejarem servir o pais como autarcas com o apoio da UNITA serão bem vindos. Estamos disponíveis para conversar.

Muito obrigado.

Presidente Isaías Samakuva
Maio de 2018