Conferência de imprensa sobre os acontecimentos à volta da
seita “Kalupeteka”
Senhores Jornalistas
Povo Angolano
Saúdo todo o povo angolano em geral e os Jornalistas,
em particular, como mensageiros da verdade e só da verdade.
O País foi recentemente surpreendido por uma onda de
violência localizada envolvendo cidadãos angolanos que estavam num retiro ou
acampamento religioso, na serra do Sumí a sensivelmente 25 km a sudeste do
Município da Caála, Província do Huambo, da qual pereceram agentes da Policia.
Todas as forças vivas da nação condenaram a violência
e lamentaram a perda de vidas humanas.
A comunicação social transmitiu-nos a
sua versão sobre os acontecimentos. Os munícipes da Caála também nos
apresentaram a sua versão, por sinal diferente da versão oficial.
O Executivo fala de uma seita ilegalizada que “periga
a paz e a estabilidade”. Os munícipes falam de uma seita com quem o Executivo
mantinha “relações privilegiadas” há alguns anos. Membros do Executivo local
assistiam aos seus cultos ou eventos e terão utilizado o líder da seita para
fazer campanha política contra a UNITA em algumas das aldeias durante as
eleições de 2012. Ainda recentemente, o líder da seita terá recebido do
Executivo, a título de oferta, uma viatura de marca Toyota Prado.
Segundo testemunhos dos munícipes, o comandante da Polícia terá falhado na sua
missão de persuadir os membros da seita a dispersar o acampamento e regressarem
às suas aldeias. Em resultado, a polícia terá amarrado o líder da seita. Os
fiéis terão interferido, tendo desarmado os dois polícias que acompanhavam o
comandante e disparado contra os agentes da Polícia com as próprias armas da
Polícia. Os demais polícias, que estavam no carro a certa distância,
retiraram-se aceleradamente em busca de reforços. Infelizmente, a viatura
capotou e todos faleceram em resultado do acidente de viação. Esta é a versão
dos munícipes.
O Executivo não diz exactamente quantos cidadãos
pacíficos e desarmados, que nada têm a ver com os ataques à Polícia ou com
Kalupeteka, terão sido mortos em retaliação ao assassinato dos polícias. Os
munícipes falam de centenas de mortes por armas pesadas a partir de
helicópteros, que dispararam indiscriminadamente sobre todas as casas na área
adjacente à serra onde estava instalado o acampamento.
Uma delegação de deputados da UNITA está no Huambo
para confortar as famílias enlutadas, vítimas dessas mortes desnecessárias e
sem sentido e também para colher mais dados do sucedido.
Só uma investigação séria e isenta poderá determinar
os factos que realmente terão ocorrido na Serra do Sumi na passada
semana.
Povo Angolano
Caros Jornalistas
A UNITA, desde algum tempo a esta parte vem
denunciando inúmeros actos bárbaros de intolerância política enquadrados na
violação de direitos humanos.
Quando alguns angolanos eram enganados com
justificações de que se tratava de ajustes de contas, a Direcção da UNITA nunca
duvidou de tratar-se de uma orientação da Direcção Central do MPLA.
Como Deus escreve direito em linhas tortas, a nossa
desconfiança ficou claramente dissipada com o documento já denunciado datado de
28 de Dezembro de 2014 a determinar o cumprimento obrigatório de um programa
até 2017 que se resume no seguinte:
“- Cessação de qualquer acto que vise o cumprimento
dos acordos, pois, o Memorando do Luena terminou com a extinção do GURN em 2008
e que, tudo o que o Governo vem fazendo daí é favor, flexibilidade e gesto de
boa vontade (característica da atitude do MPLA); o documento prossegue dando-se
orientações para o levantamento de todo o universo da UNITA a todos os níveis,
desde às FAA e PN, até às Instituições civis e de base, cumprindo-se com as
seguintes medidas:
• Proceder a exonerações e calúnias susceptíveis a processos Criminais e
judiciais;
• Eliminar (acelerar) a morte destes, uma vez hospitalizados, cuja acção deve
ser executada por militantes profissionais de cada Instituição;
• Todos os membros das ex – FMU integrados e patenteados nos órgãos de defesa e
segurança (FAA e PN) devem estar na condição de oficiais à disposição, para de
forma legal serem abrangidos pela reforma em curso nas FAA”.
Caros Jornalistas
Pondo-se em prática esta orientação, dias depois dos
horrendos assassinatos, a comunicação social exibiu imagens de material de
propaganda da UNITA, em estado novo, naturalmente plantado no local, à velha
maneira dos “corações em geleiras”, plantados no Hospital Américo Boavida, em
1975.!!
Enquanto isso, os antigos oficiais dos serviços de
inteligência militar das FAPLA e da ODP, tenente general Eugénio César
Laborinho e o general Kundi Payama, respectivamente, agora nas vestes de
governantes, apressaram-se a fazer insinuações caluniosas e irresponsáveis para
ligar a seita religiosa à UNITA, seguindo as velhas práticas bolchevistas de
desinformação e guerra psicológica.
O Governo Provincial do Huambo, do seu Comunicado do
dia 21 de Abril, ontem, portanto, extraímos o seguinte: “ A Seita Adventista no
7º dia a Luz do Mundo, aproveitando-se da fé dos seus seguidores metem em
marcha um plano politico bem orquestrado e orientado com muitos traços que
identificam a actuação politica da UNITA, levando as populações a abandonarem
as suas residências para se fixarem nas matas nomeadamente nas ex-bases
militares dessa organização politica”.
Essa acusação revela má-fé, raquitismo político e
desonestidade. Perante a mesma, perguntas colocam-se:
1. A UNITA já governou Angola para admitir seitas? Ou
alguma vez a UNITA permitiu a legalização de seita para beneficiar dos votos de
seus fiéis?
2. Como foi possível uma seita não legalizada
desenvolver acção por tanto tempo sem que a autoridade competente pusesse termo
a isso?
3. Alguém pode apontar um único encontro entre um
dirigente da UNITA com o sr kalupeteka?
4. Como foi possível haver encontros amigáveis entre
esse chefe fundamentalista e o Governo Provincial do Huambo, quer no palácio
quer na montanha onde se tinha instalado, tendo até recebido uma viatura Toyota
Prado desse Governo, um gerador de alta potência e um tractor, se o Ministério
da Cultura indeferiu o pedido de legalização?
5. Como foi possível um membro da direcção do partido
que governa o país ser fiel seguidor de uma seita ilegal, sem que a autoridade
instituída dissesse uma única palavra? O 1º Secretário do MPLA ao lado do
senhor Kalupeteka, nas imagens, senhor Miguel Somakesenje, a participar nos
cultos dessa seita, exerce, ao mesmo tempo, o cargo de Secretário Municipal da
UNITA?
6. Quem retirou as armas do museu e as levou à
montanha do Sumi?
Depois disso, o Executivo começou a utilizar os
acontecimentos nefastos da Serra do Sumi, na Caála, e os actos de intolerância
e violência política por si praticados em outros lugares, como desculpas para
impedir a realização de manifestações políticas e, assim, consolidar o ambiente
de restrição, limitação ou suspensão efectiva dos direitos políticos dos
cidadãos.
Povo angolano
O que se passa na Província do Huambo é um autêntico
terror, uma chacina, um genocídio, o que é condenável a todos os títulos.
Quem pensar que a operação que ceifou mais de 7
centenas de angolanos está terminada, engana-se! Do Km 25 em direcção à Comuna
do Kuima, estão aglomeradas crianças ao longo do asfalto, já sem os seus pais
porque ficaram órfãos.
Tanto a tropa que guarnece a barragem do Gove quanto a
21ª brigada do Sawilala, estão envolvidas na missão de ceifar mais vidas
humanas. As aldeias Kaluviavili e Kayambo, desapareceram por completo, ontem
dia 21 de Abril foram mortas 12 pessoas na aldeia Ulola pertencente à Embala
Chingolo na área da Missão do Bongo. Na Comuna de Katata foram mortas também 12
pessoas e 22 no Kuima e outras 47 pessoas raptadas, para lugar incerto na
Chilata – área do Longonjo. Os efectivos das FAA e PN espalhados pelas matas,
estão a enterrar 3 a 4 corpos numa mesma cova, para prevenirem a descoberta de
valas comuns. Recorde-se que o Comando Geral da Policia dizia que a UNITA teria
de provar a acusação sobre valas comuns! Os mesmos efectivos, mormente nas
áreas de Ulola e Perisa – Samboto, estão a retirar bandeiras da UNITA e no
Mungo um número não determinado de pessoas está detido. Portanto, a Policia não
está a cumprir a ordem judicial mas sim, a ordem superior.
Caros Jornalistas
O desvio de atenção no quadro da proposta de lei do
Registo Eleitoral e a inesperada enchente no comício do Huambo do dia 14 de
Março, fruto de um trabalho aturado de mobilização, estão na base desse
desespero de um regime que já não tem mensagem para as populações.
O que se passou na Serra do Sumi, é condenável e
lamentável a todos os títulos. Mas não pode servir de desculpa para impedir ou
restringir manifestações públicas contra a corrupção, o peculato, a má
governação e as gritantes violações dos direitos humanos, praticados pelo
regime do Presidente José Eduardo dos Santos.
Os angolanos não se devem deixar enganar nem distrair
quanto à questão central que afecta o país. A questão central que afecta o país
é a incapacidade do governo do Presidente José Eduardo dos Santos de resolver
os problemas do povo. Os preços sobem todos os dias, o Kwanza baixa todos os
dias, os níveis de desemprego sobem todos os dias, o sistema bancário falha
todos os dias e a corrupção aumenta todos os dias.
Esta é a questão central que afecta a vida das
famílias angolanas e o nosso futuro colectivo é a mudança de regime. Os
angolanos querem mudar o governo através de eleições livres, justas e
transparentes, porque este governo é corrupto, é desonesto, é insensível aos
problemas do povo e viola todos os dias os direitos fundamentais dos
cidadãos. O Executivo quer impedir a mudança por manipular o processo
eleitoral, começando já agora com a lei do registo eleitoral. Esta é a questão
central.
Em nenhum lugar a Constituição atribui ao Titular do
Poder executivo a competência de realizar o registo eleitoral presencial ou
oficioso. Seja como Chefe de Estado, Titular do poder
executivo ou Comandante em Chefe das FAA, o Executivo não pode tratar
de matérias eleitorais.
O Executivo acaba de obter o concurso de alguns
deputados à Assembleia Nacional para violarem juntos a Constituição e agredirem
juntos as regras da democracia. Não importa quantos sejam. Não importa que
sejam a maioria por enquanto. O que importa é que a Constituição
estabelece no seu artigo sexto, que “todos os actos do Estado, todas as leis da
Assembleia Nacional que não estiverem conforme a Constituição são inválidos”. Por
sua vez, as regras da democracia estabelecem que nenhuma entidade concorrente à
eleição deve controlar os actos eleitorais ou o órgão que os organiza.
Quer a Constituição, quer as regras da democracia,
impedem que o Presidente José Eduardo dos Santos controle os actos de registo
eleitoral ou os órgãos que o executam. O Presidente da República não pode ser
árbitro e jogador ao mesmo tempo. Isto significa que nenhuma eleição será
válida se for organizada em termos contrários ou não conformes com a democracia
e com a Constituição que a consagra.
Os angolanos devem estar lembrados que, em
2010, o Senhor Presidente da República utilizou a festa do CAN para distrair as
pessoas enquanto ele executava um acto político de transcendente importância
para a vida do País, a saber, a aprovação da sua Constituição atípica, que
violava o princípio da separação de poderes, violava o princípio dos limites
materiais de revisão constitucional e violava o direito fundamental do sufrágio
directo e universal para o cargo de Presidente da República.
Naquela altura, o Presidente utilizou a festa do CAN
como manobra de diversão, como ele gosta de dizer, para abafar o impacto de um
golpe constitucional.
Hoje, é nossa convicção que o Presidente José
Eduardo dos Santos escolheu o retiro numa montanha dos membros da seita
Kalupeteka como elemento da manobra de diversão de um novo golpe
constitucional: atribuir a si próprio competências em matérias
eleitorais, através da aprovação, pelos membros do seu Partido no Parlamento,
de um acto inválido.
Esta insistência do Titular do poder Executivo na
prática de actos violadores da ordem constitucional democrática e na
manipulação de factos políticos e sociais para os encobrir, constitui a questão
central actual da política nacional.
Tal postura coloca o mais alto magistrado da Nação na
situação de principal promotor das constantes agressões à paz e à reconciliação
nacional, que têm como base o primado do direito e da lei visando assegurar as
condições necessárias à estabilidade e ao desenvolvimento do país.
Povo angolano
A julgar pelos relatos que nos chegam de várias
famílias e de vários colaboradores do Executivo que não se revêm na política
actual do seu Chefe, podemos afirmar que a questão central subjacente às mortes
na Caála e suas repercursões mediáticas é de natureza política, e não
religiosa. Também é nossa convicção que o principal actor em cena é o
Executivo, e não o cidadão Kalupeteka.
E porquê?
Porque o fenómeno religioso que assola o país desde a
década de 1980 e que se manifesta na proliferação de igrejas, seitas e
denominações religiosas, tem tido o beneplácito do Governo. O governo afirma
existirem 84 igrejas ou denominações religiosas registadas e cerca de 1.200
organizações que, tendo solicitado o registo e não preenchendo os requisitos
legais, não estão registadas mas pululam em cada esquina do país e actuam à
margem da lei como os demais marginais. Destas, apenas 198 foram formalmente
banidas no ano transacto por violarem a lei.
Os sociólogos que estudam o fenómeno, salientaram já
que os líderes destas seitas exploram a vulnerabilidade das pessoas e que o
Governo utiliza algumas delas para aproveitamentos políticos e práticas de
corrupção. Há casos de líderes religiosos detidos, investigados ou expulsos,
por terem sido acusados de enriquecimento ilícito, branqueamento de capitais e
narcotráfico, em conexão com as finanças que arrecadam das suas alegadas
actividades religiosas. Todos sabemos que há ou haverá por aí muitos
Kalupetekas. A responsabilidade pelas suas actividades não pode por isso deixar
de ser imputada também ao Executivo.
O que não podemos aceitar é que a existência dessas
seitas, ou seus actos bem localizados e circunscritos a uma montanha, sirvam de
pretexto para se desencadear uma onda de intrigas e calúnias contra a UNITA na
busca de razões para se implementar planos macabros já desvendados.
Exortamos a todos os angolanos a discernirem o
significado do acto patriótico e democrático dos seus representantes, que ontem
abandonaram a sessão plenária do Parlamento em protesto contra a mais grotesca
agressão à paz e à estabilidade praticada na história da República de Angola
após a aprovação da constituição atípica de 2010.
Para terminar, a UNITA condena:
• A proliferação de cantinas, armazéns e inúmeros
outros negócios, associados a membros do regime, que arrastam para Angola
milhares de emigrantes ilegais e que engrossam depois igrejas e seitas novas
com posturas e comportamentos contrários aos comuns valores da angolanidade;
• As elevadas transferências de divisas que algumas
igrejas efectuam para fora do pais, cujo dossier o banco nacional de Angola bem
conhece, muitas destas para regiões afectadas por fenómenos de instabilidade e
de terrorismo. Estes factos têm merecido a chamada de atenção do governo
angolano, por parte de alguns países amigos, que há muito se têm mostrado
preocupados pelo deixa andar das nossas autoridades.
.
Luanda, 22 de Abril de 2015
O Secretário Geral da UNITA