INTERVENÇÃO: DEBATE SOBRE CONTA GERAL DO ETADO REFERENTE AO EXERCÍCIO ECONÓMICO DE 2014
Excelência Sr. Presidente da Assembleia Nacional;
Ilustres Deputados;
Ilustres Auxiliares do Titular do Poder Executivo.
Minhas Senhoras e Meus Senhores:
Ontem, ao olharmos para os níveis de eficiência e de eficácia da execução orçamental no primeiro trimestre deste ano, tivemos a ocasião de exprimir a nossa tristeza e as inúmeras dúvidas que nos assolam pelo facto de sermos impedidos de, nos termos claros da Constituição, acompanharmos a forma como é executado o OGE.
Este exercício de análise da Conta Geral do Estado começou em 17 de Outubro de 2013, com muitas incongruências, muitas zonas cinzentas, lacunas que continuam a persisistir, quando vamos na quarta Conta Geral do Estado. Ainda hoje repete-se o mesmo rosário de recomendações, por parte do Tribunal de Contas, a mostrar essas graves falhas, que ocorrem por razões que a razão ainda não nos sabe dizer.
O Instituto Nacional de Estatística, que nos últimos 3, 4 anos não tem tornado publicas as contas nacionais, já esteve várias vezes em desalinhamento com os dados apresentados pelo Governo, este empolando os números para fins que todos conhecemos.
Deste modo, haverá sempre dúvidas quanto aos dados fornecidos pelas contas públicas, por causa da sua inconsistência e incongruência, num país onde se assiste ao paradoxo de indicadores a mostrar, por exemplo, que quando a economia cresce o emprego desce; e quando a economia decresce, o emprego cresce.
Punge a alma verificar que o nosso país, quase-potência regional, não tem competitividade económica face aos países da SADC. Até Moçambique consegue, mau grado todas as dificuldades, estar à frete de Angola, em termos de competitividade da sua economia. E somos uma quase-potência. O que seria se não o fôssemos?
Senhor Presidente,
Ilustres Deputados,
Minhas Senhoras e Meus Senhores:
Esta Conta Geral do Estado continua a evidenciar graves Incongruências nas operações relacionadas com o património financeiro do Estado, especialmente no capital das sociedades comerciais de capitais públicos, com a omissão das despesas do Estado no saneamento financeiro e na constituição ou aumento de capital (como se pode ver na página 60 e seguintes do documento em análise). Constata-se que continua a verificar-se uma grave violação das normas da lei-quadro do OGE, uma vez que dispõem os artigos 1º e 58º da referida Lei-Quadro, que o seu âmbito de aplicação são todos os recursos públicos, não se entendendo, por isso, que o Sector Empresarial Público (tanto ao nível das empresas públicas, como das sociedades comerciais de capitais públicos), continue a acusar incongruências e deficiências dos sistemas de contabilização e controlo, com reflexo nos elementos da Conta Geral do Estado, não estando descriminado o relatório de execução para este subsector da Administração Indirecta do Estado.
Aliás, O Tribunal de Contas, tem estado a alertar para a falta de dados e de fiabilidade do sector empresarial público, sendo recomendado ao Executivo, a necessidade de criação de procedimentos de controlo eficazes que identifiquem situações irregulares ou debilidades quanto à obrigação de reportar os documentos contabilísticos ao Ministério das Finanças, e que os resultados desse controlo sejam divulgados.?
A Conta Geral do Estado indica, na página 43, que foram efectuadas despesas em transferência de capital para o Fundo Rodoviário, BODIVA e a SODEPAC. Temos igualmente, na página 66, uma listagem das empresas em que o Estado tem participações. Mas, muito infelizmente, não figura nessa lista a CIMANGOLA. E a pergunta obrigatória é a seguinte: o que é que aconteceu com as acções do Estado na CIMANGOLA?.... Quem diz que a CIMANGOLA tem capitais públicos não somos nós, mas antes o parágrafo segundo do Decreto Presidencial Nº 95/14 de 5 Maio. Porque razão, afinal, a transferência dos 116 milhões de dólares não vem espelhada nesta Conta Geral do Estado? Ou será que, neste país de fantasmas (com pilotos fantasmas, polícias fantasmas, funcionários fantasmas), esse dinheiro também, mais esse, virou fantasma?
Esta Conta Geral do Estado continua a não incluir as receitas e as despesas de todos os serviços, em violação do princípio da universalidade, consagrado no artigo 5º da Lei-Quadro do Orçamento Geral do Estado.
Senhor Presidente, Ilustres Deputados:
Neste país, ainda irremediavelmente dependente do petróleo, a SONANGOL tem um peso significativo e até singular. Mas, por que razão não podemos saber que saúde tem ou deixa de ter a nossa SONANGOL? Sim, nossa de todos os angolanos, já que “Estado” somos todos nós, não tendo essa empresa sido comprada nem pelo MPLA, nem pela UNITA, pela CASA-CE, pelo PRS, pela FNLA, pelo PDP-ANA, pelo Bloco Democrático, ou por qualquer outra entidade, política ou não, singular ou colectiva.
Ouvimos dizer que a SONANGOL deve 1 bilhão de dólares à multinacional suíça TRAFIGURA, pela importação de combustíveis, o que pode contribuir para o agravamento da nossa já precária situação. Rejeitada a proposta da TOTAL E&P Angola, de extensão da capacidade da refinaria sob sua gestão, por causa do “affair” do “primo” Pierre Falcone, a TRAFIGURA tem estado a comandar a importação, por Angola, dos derivados do petróleo, nomeadamente a gasolina e o gasóleo, através da sua subsidiaria PUMA ENERGY. Nessa negociata há um emaranhado de coisas que, se calhar, faria muito bem à SONANGOL vir explicar, sobretudo agora que tem uma nova e, diz-se, eficiente direcção. Sabemos que, muito recentemente, essa nova direcção da SONANGOL foi ao encontro do Grupo Parlamentar do MPLA explicar “algumas coisinhas”.
Como o petróleo é de todos nós – e a SONANGOL também – o Grupo Parlamentar da UNITA vai, ele também, solicitar à direcção dessa empresa pública que venha explicar-nos “algumas coisinhas”, em nome da igualdade constitucional do Artigo 23º, que nos dá a todos (“MPLAs”, “UNITAs”, “FNLAs”, “CASAs”, “PRSses”) o mesmo direito de saber o que é feito com o que é de todos nós. Ou assim não está bom?
Em Cabinda não se pode fazer refinaria. O porto de águas profundas, depois de andar dos estudos ao lançamento das primeiras pedras, parqueou agora na vedação do perímetro, coisas para inglês ver onde nem ingleses há. Enfim! Já aqui eu dizia uma vez que a única forma de se sair daqui para Cabinda e de lá para cá é por via aérea, falhada a hipótese da ponte sobre o Rio Zaire daqueles que se esqueceram que há ainda território da República Democrática do Congo antes de chegarmos a Cabinda.
Portugal que teve de fazer face a um resgate, não deixou de subvencionar o custo dos bilhetes de passagem de e para a Madeira e os Açores. O Senhor Ministro das
Finanças, que aqui está presente, muito felizmente, afirmou que Angola não tinha uma situação semelhante a de Portugal. E tinha razão. Se as equipas de futebol de Cabinda estão inseridas no Gira-Bola para jogar mesmo, deviam ter alguma facilidade de deslocação. Perdem jogos por falta de comparência, justamente por não terem recursos que lhes permitam viajar. Será que não se pode fazer nada para resolver essa situação?
Senhor Presidente da Assembleia Nacional; Caros Colegas Deputados:
Ouvimos aqui um ilustre colega deputado da bancada do MPLA dizer, e muito bem, e citando Mao Tsé-Tung, que “a prática é o critério da verdade”. Quis esse colega dizer que não é com palavras que a verdade se mostra e demonstra, mas com factos práticos. Tem toda a razão. A pergunta que faço é a seguinte: a situação de fome, de miséria, de falta de emprego e de desemprego, de falta de medicamento, de subida drástica dos bens de primeira necessidade, não é “critério da verdade”?
Também dizia Mao Tsé-Tung que “Só progride quem é modesto; (pois) o orgulho obriga a dar passos para trás” – fim de citação. Talvez seja por isso que andamos a dar passos para trás, na vertente económica, social e outras. Se se agisse de forma diferente, nunca se poderia pensar que o preço de uma “commodity” como o petróleo conseguiria morar eternamente nos “cento e tais” dólares e nunca descer de lá.
Ora, de dito em dito, deixo aqui um, para reflexão: “as únicas pessoas que se enfurecem ao ouvir a verdade, são aquelas que vivem na mentira”.
Muito obrigado, Senhor Presidente.
21 de Juho de2016
Raúl Danda | |