Exmo. Senhor Vice Presidente do Partido
Exmo. Senhor Secretário Geral Adjunto
Caros companheiros membros da Direcção do nosso Partido
Ilustres membros do Corpo Diplomático representado em Angola
Distintos membros da Sociedade Civil,
Caros representantes de Igrejas
Distintos Convidados
Minhas senhoras e meus senhores
É com muito prazer que aproveitamos esta quadra festiva para partilhar com os angolanos o nosso balanço do ano político de 2017 e a nossa perspectiva para 2018.
O ano que agora finda foi marcante, histórico e excitante para o nosso país político: o Presidente José Eduardo dos Santos deixou a chefia do Estado, a Comissão Nacional Eleitoral anunciou resultados que ela própria não produziu, e o novo Presidente assim investido procura afirmar-se como Presidente de uma República e combater a corrupção institucionalizada.
No nosso dia-a-dia a vida da grande maioria dos angolanos piorou, porque os preços dos principais produtos que já tinham subido 42% em 2016 voltaram a subir mais 25% em 2017, os hospitais continuam sem medicamentos, o ensino continua sem qualidade, o desemprego cresce todos os dias e as famílias continuam a abastecer-se com água das cisternas e energia dos geradores.
Os salários perderam, portanto, cerca de 70% do seu poder de compra, o governo aumentou a dívida pública para mais de 60% do PIB e os consumidores perderam a confiança no sistema bancário. Enquanto isso, multiplicaram-se durante o ano as noticias sobre fortunas angolanas no estrangeiro, geradas e transferidas ilicitamente, cujo valor acumulado é superior ao valor das reservas internacionais liquidas do Estado controladas pelo Banco Nacional de Angola.
Consolidou-se a convicção generalizada de que o Estado faliu, foi capturado por um partido político, tornou-se incapaz de prestar serviços básicos à população e de cumprir satisfatoriamente as tarefas fundamentais do Estado estabelecidas pela Constituição. Antes mesmo do dia 23 de Agosto, já os angolanos tinham decidido mudar o rumo do país.
O Partido estado que controla o país só podia sobreviver se atendesse de alguma maneira o clamor do povo por mudança. Prometeu, por isso, “corrigir o que está mal”.
Em resposta, a UNITA optou por duas medidas de política fundamentais: em primeiro lugar, dar tempo ao Partido estado para operar a mudança em paz, por via institucional, tomando os lugares que lhe foram atribuídos no Parlamento; em segundo lugar, dar ao novo Presidente da República o beneficio da dúvida durante os primeiros cem dias do seu mandato.
Estando praticamente no final dos cem dias, concluímos que o Presidente João Lourenço tem vontade política para dar ao país um nova orientação política, mas as medidas que preconiza são insuficientes para corrigir o cerne do que está mal, porque atacam apenas os sintomas dos problemas, e não toca nas suas raízes ou causas mais profundas.
As causas mais profundas da exclusão, da intolerância, dos monopólios e da cultura de impunidade subjacente à má governação e à corrupção institucionalizada, são duas: a captura do Estado por um Partido político, o MPLA, que é o partido do Presidente da República, e a cultura ou o estigma de superioridade que esse Partido ostenta em relação à Lei, à Pátria, ao Estado e à Nação.
A solução para estes dois problemas fundamentais traduz-se, por isso, no binómio despartidarização do Estado e reconciliação nacional, duas faces da mesma moeda: a despartidarização do Estado exige a reconciliação nacional e a reconciliação nacional reclama a despartidarização do Estado. Sendo importantes e fulcrais no processo da normalização da vida do nosso País, escolhi para este meu último pronunciamento do ano, fazer uma reflexão sobre a despartidarização do Estado e a reconciliação nacional.
Este tema reconduz-nos às conflitualidades e aos problemas mal resolvidos inerentes à construção do Estado e à partilha da nacionalidade angolana pelos vários grupos sociais que legitimamente a reclamam.
Apesar da sua relevância em face da profundidade das questões a resolver, a reconciliação nacional em Angola, mesmo depois de muitos Acordos, não conseguiu ultrapassar o espírito de conflitualidade e instalar a cultura da tolerância e da igualdade, eixos fundamentais para a construção de estruturas políticas, sociais, económicas e culturais perenes e inclusivas, ao serviço da diversidade política e cultural da cidadania.
A conflitualidade entre os angolanos foi vivenciada já durante a guerra de libertação nacional contra o colonialismo português, quer no seio dos próprios movimentos de libertação, quer na confrontação fratricida entre a FNLA e o MPLA, e, posteriormente, entre o MPLA e a UNITA, facto que teve fortes consequências na gestão da transição de Angola de país colonizado para país independente e na matriz política totalitária que caracterizou a primeira República.
Os Acordos de Bicesse, que puseram termo à guerra pós-colonial e abriram a oportunidade dos angolanos construírem definitivamente as bases da reconciliação política, económica, social e cultural, não foram suficientes para evitar a abertura de um novo capítulo na conflitualidade nacional.
Assim, a segunda República nasceu também sob os auspícios da cultura totalitária, da desconfiança, do medo e da exclusão do irmão inimigo, factos que conduziram Angola para uma guerra atroz que terminou em 2002.
Esta cultura totalitária de exclusão do irmão inimigo e de todos aqueles que se revelam críticos ao estigma de superioridade que o MPLA ostenta em relação à Lei, à Pátria, ao Estado e à Nação é que alimenta a intolerância e a impunidade. É ela que sustenta a falsa necessidade e legitimidade de se capturar e partidarizar o Estado, apropriarem-se das finanças públicas, subverter-se a Constituição e viciarem-se os processos eleitorais.
É ela que, em última instância, alimenta a cultura da legitimidade da fraude e da corrupção. Corrupção nas finanças, corrupção na educação, corrupção na saúde, corrupção na justiça, corrupção nas eleições. A institucionalização, pelo Partido Estado, da cultura da fraude e da corrupção, introduziu no país a cultura da impunidade.
Portanto, os crimes económicos de peculato, enriquecimento ilícito, branqueamento de capitais e improbidade publica cometidos já em tempo de paz, nas décadas de 2000 e 2010, na sequência das descobertas de petróleo em águas profundas, são meros exemplos ou manifestações dessa cultura e consequência lógica da partidarização e captura do Estado pelo MPLA.
Minhas senhoras e meus senhores
Angola só conseguirá corrigir o que está mal se começar por atacar as causas mais profundas do mal. Não bastam as exonerações, a diabolização ou substituições de pessoas. O problema não reside apenas na acumulação primitiva de capital nem na responsabilização criminal de membros da mesma família biológica ou política. O problema reside, repito, na cultura de exclusão do irmão inimigo e de todos aqueles que se revelam críticos ao estigma de superioridade que o MPLA ostenta em relação à Lei, à Pátria, ao Estado e à Nação.
E a solução definitiva para esse problema, repito, é o binómio despartidarização do Estado e reconciliação nacional.
O que se tem de extirpar primeiro é a cultura, o modo de ser e de estar, e depois, naturalmente, as práticas ou manifestações diversas dessa cultura.
Esta cultura desviante e institucionalizada só se combate através do diálogo, do exemplo e de medidas institucionalizadas, simbólicas e substantivas, insertas num amplo movimento nacional de mudança.
A UNITA está disponível para uma concertação directa tanto com o MPLA como com o Estado angolano, com vista a se utilizar a presente oportunidade para os angolanos encontrarem novos caminhos e novas abordagens para a concretização da reconciliação nacional
Os princípios orientadores do diálogo poderão incluir, por exemplo, o reconhecimento por todos dos seguintes factos:
a) Culpados somos todos, responsáveis somos todos, vítimas somos todos.
b) Uma guerra civil não tem vencidos nem vencedores. A História política de Angola deve ser escrita no espírito da reconciliação nacional e da construção da Nação.
c) A reconciliação nacional tem dimensões políticas, económicas, sociais e culturais.
A agenda para este amplo e decisivo diálogo nacional poderá incluir os seguintes tópicos:
a) Definição do conceito, objectivos e do âmbito da despartidarização do Estado e da reconciliação nacional;
b) Afirmação da vontade política do Estado para encerrar a era da partidarização do Estado;
c) Fim do período da utilização dos cargos públicos para enriquecimento ilícito;
d) Afirmação da vontade política nacional para encerrar a era do enriquecimento ilícito e da impunidade;
e) Abordagem frontal e sincera da questão mal resolvida da desmobilização dos ex-militares, antigos combatentes e veteranos da Pátria;
f) Memorial dos pais da independência nacional;
g) Memorial das vítimas da guerra colonial e pós-colonial;
h) Fundamentos do novo contrato social angolano para a construção do futuro inclusivo e partilhado por todos, no quadro de uma nova República.
i) Investimentos públicos para a reconciliação nacional.
Pela complexidade que a reconciliação nacional encerra em Angola, o modelo a seguir e os conteúdos a discutir devem revisitar as fórmulas ancestrais, as experiências contemporâneas de vários países que experimentaram o fratricídio e contextualizá-las de forma a criar-se um espaço político, económico, social e cultural onde seja possível viver a verdade, o perdão, a justiça, o reconhecimento e a aceitação recíproca.
Considero que o inicio do ano de 2018 constitui uma oportunidade ímpar para começarmos a partir os muros altos da partidarização do Estado e construirmos os fundamentos para a construção de Nação, inclusiva, solidária e verdadeiramente reconciliada.
FAÇAMOS DE 2018 O ANO DA DESPARTIDARIZAÇÃO DO ESTADO E DA RECONCILIAÇÃO NACIONAL.
Desejo a todos muita saúde, paz e uma cidadania partilhada por todos num espírito de genuína reconciliação nacional.
Muito obrigado. | |